REVISTA FACTO
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Jan-Abr 2020 • ANO XIV • ISSN 2623-1177
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//Artigo

UTILIZAÇÃO DO LÍTIO NA INDÚSTRIA NUCLEAR GERA PARCERIA ENTRE UNIVERSIDADE E EMPRESA NO BRASIL

O Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN/SP) e a Companhia Brasileira de Lítio (CBL) estabeleceram uma parceria cujo objetivo é desenvolver metodologias científicas para inovação tecnológica e cuja meta é a produção do isótopo de lítio-7 por meio do processo de troca iônica. O projeto já atingiu seu primeiro objetivo: a purificação do lítio em nível maior que 99,99% por meio da troca iônica, demonstrando a sua viabilidade. Trata-se de uma pesquisa aplicada, por meio da qual será desenvolvido um novo processo para obtenção do lítio-7 a ser utilizado na indústria nuclear.

Tal projeto proporcionará vantagens para a indústria e a ciência nacionais. No âmbito industrial, a produção do isótopo lítio-7 tornará o Brasil independente da importação de material estratégico para a indústria nuclear. No âmbito científico, a iniciativa vai gerar uma patente de separação do lítio-7 – tornando o País uma das poucas nações do mundo a possuírem tal tecnologia –, além de produzir conhecimento inovador e recursos humanos básicos, os quais poderão ser usados como multiplicadores desse próprio conhecimento. O projeto também permitirá uma importante sinergia entre indústria e instituição de pesquisa para a geração de um produto de interesse comercial no âmbito industrial e de interesse energético nacional, valendo-se dos recursos humanos desenvolvidos pela universidade na área científica.

O lítio se destaca como insumo multiuso. Atualmente é reconhecido mundialmente como matéria-prima na produção de baterias para dispositivos eletrônicos. O metal também é utilizado em várias fases da produção industrial, como graxas/lubrificantes, cerâmicas, vidros, polímeros, e até em fórmulas farmacêuticas.

Na indústria nuclear, o lítio – especificamente seus isótopos constituintes – é utilizado nos reatores de potência e sua separação isotópica é de grande interesse na tecnologia nuclear. O lítio natural é composto por dois isótopos estáveis, o 6Li (lítio-6) e o 7Li (lítio-7).  Os isótopos de um elemento químico, especialmente no caso do lítio, apresentam propriedades químicas e físicas muito semelhantes. No entanto, comportam-se como substâncias completamente diferentes quando utilizados em aplicações na área nuclear.

O lítio-6 é empregado na produção secundária dos chamados dispositivos termonucleares, utilizados como combustíveis em reatores de fusão nuclear. Já o lítio-7 é um produto usado na refrigeração da água do circuito primário dos reatores nucleares de potência PWR (Pressurized Water Reactor) para manter o pH constante. Seu uso é feito nos reatores nucleares de potência PWR localizados em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. Atualmente o lítio-7 é adquirido no mercado internacional, mas esse mercado está fechando por razões estratégicas. Por isso, o desenvolvimento de novos processos de separação isotópica do lítio que se ajustem ao mercado nacional é um desafio para os institutos de pesquisas nucleares no Brasil.

No Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN/SP), está sendo desenvolvida a técnica da separação isotópica do lítio utilizando o processo de troca iônica. Os processos baseados na troca iônica permitem configurações experimentais favoráveis, tanto para estudos na escala de bancada quanto para dimensões superiores, com aumento significativo nas quantidades de materiais envolvidos. A troca iônica se mostra significativa, pois os resultados satisfatórios são obtidos à temperatura ambiente. Assim, a demanda de energia para o controle fino da temperatura não chega a ser fator desfavorável ao se aplicarem operações de troca iônica. Outro fator com impacto financeiro positivo é a reutilização das resinas de troca iônica em aplicações posteriores. Além disso, esse processo não gera resíduos tóxicos ao meio ambiente, como outros processos de separação de lítio que podem gerar até mercúrio.

No Brasil, o espodumênio é um dos minérios mais importantes para a obtenção do lítio, possuindo de 1,5 a 7,0% de lítio. A Companhia Brasileira de Lítio (CBL), uma empresa 100% nacional, explora o mineral, produzindo desde 1991 derivados químicos do mesmo. A produção, realizada em Minas Gerais, atende todo o mercado nacional. Os principais produtos são o carbonato e o hidróxido de lítio. Nas duas unidades industriais da companhia – a mina em Araçuaí e a planta química em Divisa Alegre –, são produzidas anualmente cerca de 15 mil ton/ano de espodumênio, de 500 a 600 ton/ano de hidróxido de lítio e de 500 a 600 ton/ano de carbonato de lítio.

As dificuldades da CBL foram imensas, principalmente por se tratar de uma lavra subterrânea, cujas reservas estão localizadas na região nordeste de Minas Gerais, no Vale do Rio Jequitinhonha, uma das mais carentes do país.  Hoje, a situação é bastante distinta daquela vivida no final dos anos 1980, quando a CBL foi efetivamente implantada. No momento, tanto Araçuaí/Itinga, onde se localizam a mina e a unidade de beneficiamento do minério, quanto Divisa Alegre, onde foi construída a planta química, são polos de desenvolvimento da região. Em São Paulo está seu escritório comercial e financeiro.

A CBL ganhou em 2013 o prêmio Empresa do Ano do Setor Mineral, em evento patrocinado pela revista Brasil Mineral, destacando-se entre as empresas do seu porte. A unidade de mineração da companhia possui o Certificado ISO9001:2008 e todas as unidades operacionais estão rigorosamente em dia com suas licenças ambientais, expedidas pela SUPRAM-Jequitinhonha/Diamantina, em Minas Gerais.

A empresa possui três metas estratégicas de negócios: a) desenvolver produtos para a área nuclear brasileira; b) equilibrar a diferença de custos entre a rota de salmouras vulcânicas e a mineração subterrânea, com valorização dos coprodutos; c) aumentar sua capacidade para atender às novas demandas oriundas principalmente dos carros elétricos e híbridos.

A área de P&D da companhia desenvolveu um processo para a produção do carbonato de lítio grau bateria e está fazendo análise dos investimentos necessários para ampliar sua capacidade produtiva, a fim de, em médio prazo, suprir eventuais empresas fabricantes de baterias de íon lítio no Brasil. Para aumentar ainda mais sua competitividade dentro e fora do País, a CBL implantou uma unidade piloto de beneficiamento do silicato de alumínio, e continua fazendo pesquisas com a finalidade de encontrar uma forma de utilização desse produto em aplicações nobres das indústrias de plásticos, tintas e borrachas. Para mostrar o aspecto estratégico de lítio, a empresa considera relevante que o mesmo possa atender à necessidade do setor nuclear brasileiro. Trata-se de um projeto inovador, pois não existe no Brasil o produto em questão e a tecnologia para a sua produção ainda está sendo desenvolvida.

Oscar Vega Bustillos
Oscar Vega Bustillos
Pesquisador do Centro de Química e Meio Ambiente (CQMA) do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN/CNEN-SP).
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